quarta-feira, setembro 18, 2024
spot_img
InícioRamos da InformáticaMetodologiasUsabilidade nas mensagens de erro

Usabilidade nas mensagens de erro

As mensagens de erro devem se desculpar? Vamos tratar sobre usabilidade com o usuário de forma teórica e no final dar dicas diretas.

Essa questão é complexa e envolve, ao meu ver, dois aspectos principais:

  • O contexto cultural no qual a interação humano-computador está inserida.
  • O contexto de utilização (erro, alerta informativo, etc) que fez necessária a exibição da mensagem ao usuário.

Sobre o contexto cultural…

Primeiramente, há de se considerar que existem diferenças culturais significativas com relação ao ato de se desculpar. Há estudos comparando as culturas americana e japonesa que mostram que em certas situações (como, por exemplo, quando alguém recolhe uma caneta que você derrubou) americanos utilizam a palavra thanks (obrigado) para expressar gratidão enquanto que japoneses utilizam a palavra sumimasen (sinto muito) para expressar um sentimento semelhante – ainda que sob um significado cultural de humildade ou subjugação (Sugimoto, Naomi. “Sorry we apologize so much”: Linguistic Factors Affecting Japanese and U.S. American Styles of Apology. Intercultural Communication Studies VIII-1, 1998).

Eu procurei encontrar material semelhante comparando outras culturas com culturas latinas, mas não encontrei (talvez esses estudos ainda não sejam comuns por aqui). De todas as formas, por experiência própria eu acredito que essa mesma distinção também existe com relação à nossa cultura: tenho amigos ingleses e franceses que não têm o menor pudor em convidar apenas parte de um grupo para uma festa infantil (em frente aos demais, não convidados por não se encaixarem na condição “ter filhos”); nesse mesmo cenário, nós latinos faríamos o convite de forma individual e privada ou nos desculparíamos por não convidar os solteiros e os casais sem filhos.

O fato é que a desculpa é um lubrificante social importante, cujo caráter na interação serve também como forma de indicar a real intenção do interlocutor (algo como “eu realmente não quis te machucar/incomodar de propósito”), e por isso é tradicionalmente utilizada para iniciar uma conversação considerando uma possível interrupção de qualquer introspecção/atividade do destinatário da mensagem (Wagatsuma, Hiroshi e Rosett, Arthur. “The Implications of Apology: Law and Culture in Japan and the United States”. Law & Society Review, v.20, n.4, 1986). Especialmente em relação à cultura japonesa, o pedido de desculpa é considerado como necessário para “preparar a atmosfera” da interação (“Why Japanese apologize so often?”, Facebook Note – Japanese Language & Culture, 2008), mas novamente eu acredito que isso também se passa na cultura latina quando iniciamos uma conversação (“desculpe senhor, que horas são?” não necessariamente indica uma falha ou culpa, e tem para nós praticamente o mesmo significado de “com licença senhor, que horas são?”).

Sobre o contexto de utilização…

Além do contexto cultural, há de se considerar também que a apresentação da mensagem tem por objetivo comunicar ao usuário (leia-se “o homem”) alguma informação relevante da condição em que a aplicação (leia-se “o computador”) se encontra. Em outras palavras, trata-se de uma interação humano-computador iniciada pelo computador. Há pouco mais de 10 anos os cientistas da computação se interessam por pesquisas relacionadas à Experiência de Usuário e à Computação Afetiva, e cada vez mais se acredita que o caráter hedônico, emocional e social da interação é fundamental não apenas na escolha de um produto como também na continuidade de sua utilização. Isso quer dizer que não basta um produto ser seguro, eficaz e agradável (no sentido de ausência de desconforto), ele também deve prover uma experiência interessante e apropriada ao contexto em que é utilizado.

Lembro-me do key note apresentado pela profa. Dra. Soraia Raupp Musse no WVC’2008 em que ela citou o exemplo de uma das primeiras sessões do filme “O Expresso Polar” apresentada para uma plateia de crianças. Segundo a professora, a forma como os olhos dos personagens se moviam em uma determinada cena (não lembro qual especificamente) era tão distinta do natural que muitas das crianças pequenas simplesmente choraram de medo. Esse exemplo é um tanto exagerado aqui, mas serve para ilustrar o ponto em que quero chegar: a forma como a interação ocorre é importante para a parte humana dessa interação, pois é natural que nós busquemos humanizar o outro lado (isto é, a máquina).

Há inúmeros trabalhos sendo realizados para construir agentes computacionais humanoides com o objetivo de tornar a interação mais empática por meio da mimetização de expressões faciais e corpóreas, e também de expressões vocais como o “hum hum” que denota “estou te entendendo” (exemplos 1234, e especialmente 5 e 6). Eu creio que todo esse esforço significa que há um reconhecimento da importância da humanização da máquina nessa interação humano-computador.

Essa thread no User Experience que trata do mesmo assunto. A resposta aceita (e também com mais votos) concorda que o uso de “desculpas” é apropriado e muitas vezes necessário. Entre os diversos argumentos (aconselho a leitura da questão e suas respostas), há dois baseados em citações de estudos científicos cujos resultados apoiam uma estratégia cortês de se desculpar.

A primeira citação é ao artigo “The Effect of Apologetic Error Messages and Mood States on Computer Users’ Self-appraisal of Performance“. A passagem que me parece relevante é essa (em tradução livre):

[…] Quando os usuários encontraram problemas, o sistema proveu certas mensagens de erro representando uma estratégia de cortesia positiva (por exemplo, uma piada), uma negativa (por exemplo, uma simples desculpa) e uma mensagem de erro mecânica (por exemplo, a página está temporariamente indisponível). Os resultados do estudo demonstram que os usuários que lidam com eventos sociais e expressões de cortesia preferem significativamente mais receber mensagens com desculpas do que mensagens mecânicas ou com piadas; também preferem significativamente mais receber tais mensagens do que outras opções menos corteses.

A segunda citação é tirada do artigo “Computer Apology: The Effect of the Apologetic Feedback on Users in Computerized Environment“. Novamente, o que parece relevante em tradução livre:

[…] esse estudo mostra que quase todos os participantes não consideraram as respostas (feedbacks) com desculpas como algo estranho, sendo que 95% deles considerou tais respostas delicadas e uma consideração ao seu bem-estar. Nesse aspecto, parece que os participantes acham tão interessante perceber um comportamento respeitoso (como um pedido de desculpas) quando encontram um erro causado pela inabilidade do computador como achariam se encontrassem um problema na interação com um humano. Esses resultados do estudo indicam que a representação do estado afetivo de uma pessoa no projeto de interface é muito importante na interação humano-computador porque as pessoas são mais compreensivas ao ver aspectos emocionais na interface como sensibilidade, respeito e sensação de humanidade. Assim, esses resultados talvez sejam evidências para suportar que o uso de expressões com desculpas em computadores pode fomentar a ideia de um projeto realmente centrado no usuário.

Cabe notar que não necessariamente as desculpas são mais apropriadas do que humor. No estudo científico da primeira citação a orientação dos usuários foi previamente avaliada e é esperado que pessoas que vivem em contextos sociais mais corteses (talvez, por exemplo, atendentes de hotel) prefiram comportamentos similares nos sistemas com que interagem. De todas as formas, nota-se nas duas pesquisa que a questão crucial é a humanização com que os usuários tratam o sistema, que deve ser incluída no projeto da interação de uma forma ou de outra.

Cuidado ao pedir desculpas em uma exceção

Se desculpar por um erro não levaria um usuário a maioria dos usuários a pensar “nossa que legal, ele sabe que o erro foi dele”; uma mensagem de erro onde o sistema admite um erro passa a imagem de que erros são tão constantes que ele admite através da mensagem.

Um cliente demasiadamente rigoroso poderia encarar com maus olhos um sistema que pede desculpas por um erro.

Exceções ao que eu falei acima existem? Claro! Mas eu só vejo acontecer com grandes empresas: Google, Yahoo, etc. Se seu projeto tem uma boa reputação no mercado e o nome da empresa for de peso você poderia utilizar a mensagem como desculpa até mesmo para dar a entender que: “meu sistema é tão difícil de dar erro que acabou acontecendo. desculpe”.

O que devemos avaliar ao exibir uma mensagem erro?

Existem diversos fatores que devemos pesar ao criar uma mensagem de erro:

  1. Qual o nível do usuário? Se seu usuário incluir pessoas com pouca afinidade com a informática, não tem razão para utilizar termos técnicos ou mensagem complexas.
  2. Qual a clareza da mensagem? Qualquer pessoa que ler a mensagem será capaz de entender o erro? Talvez foi um NullPointerException que estourou no código, ou então foi um SaldoInsuficienteException; independente do tipo de erro a mensagem está clara?
  3. Sempre definir a próxima ação do usário. Qual será a próxima ação após o erro? Tentar novamente? Entrar em contato com o suporte? Realizar alguma ação (como preencher determinado input) para que o erro não aconteça mais?
  4. Nunca exibir o erro técnico. Evite deixar que qualquer erro seja exibido ao usuário sem ser tratado. Se a linguagem fosse Java, por exemplo, você poderia criar um ExceptionHandler que trataria qualquer tipo de erro que acontecesse no sistema (seja um erro esperado ou não). O problema de exibir o erro técnico para o usuário é que um hacker poderia utilizar essa mensagem de erro para te atacar.

Dicas para uma boa mensagem de erro

  1. Se o seu cliente for alguém informal você poderia tentar algo engraçado. Alguns exemplos seriam: Twitter (a baleia), Google (que fala de macacos que trabalham lá), GIT (Que mostra um JEDI para página não encontrada) e assim vai.
  2. Se o seu cliente for alguém formal, tome cuidado com o que será exibido. O ideal seria informar que um erro inesperado aconteceu. Se possível, coloque um botão onde o cliente poderia enviar um email detalhando o problema.

Agradando ao cliente

Quando um cliente percebe que existe uma pré-disposição do projeto para agir em um caso de erro, ele fica mais satisfeito. Apenas é bom dar uma resposta rápida ao usuário, nem que seja um email automático até que o problema seja analisado.

Leia também:

Ramos da Informática
Ramos da Informáticahttps://ramosdainformatica.com.br
Ramos da Informática é um hub de comunidade sobre linguagens de programação, banco de dados, DevOps, Internet das Coisas, tecnologia da indústria 4.0, Cyber Segurança e Startups.
ARTIGOS RELACIONADOS
- Advertisment -spot_img

MAIS LIDOS

Sua assinatura não pôde ser validada.
Você fez sua assinatura com sucesso.

E-Zine Ramos da Informática

Assine o E-Zine e tenha Conteúdo Exclusivo, Concursos para assinantes, descontos exclusivos e uma área de conteúdos exclusivos só do E-zine.